domingo, 3 de outubro de 2010

A dona da história

  
Porque li no decorrer desta semana um romance (autobiográfico?) de Salwa Al-Neimi, intitulado “A prova do mel” (Editora Objetiva, 2009), hoje vou despir minha crônica de quaisquer personagens e deixar fluir pensamentos próprios. Não me lembrem, portanto, daquela máxima que já repeti, de algum lugar, de 90% invenção e 10% mentira. Faço isso, a princípio talvez, movida pela similitude. O romance de Al-Neimi é considerado erótico. Eu própria já disse, por ocasião do lançamento de meu livro de poesia, que há em meus poemas uma grande dose de erotismo. Os leitores mais atentos decerto já o vislumbraram também em várias de minhas crônicas.

Mas trazer à tona esse tema em dia de eleição? Um amigo meu chamou Dilma de assexuada. No momento, devo confessar, a comparação foi inevitável, pois que Lula sempre me seduziu – e não só pelo seu discurso. Confesso ainda mais, sentindo o enrubescer das faces: quando vejo a imagem de Lula estampada em revista ou jornal (sim, impressa; na TV não), quando vejo, me dá uma vontade de homem com a barba por fazer, o contraste entre a pele áspera e a suavidade feminina...

Gosto de Dilma pela força, sem afeto, sem sensualidade, sem nenhuma ardência no rosto (por sinal, acho muito bom que seja assim). Não pretendo, entretanto, fazer uma crônica política pseudoerótica ou vice-versa. Aliás, odeio crônicas políticas; faltam-lhes paladar literário. Tenho, às vezes, ojeriza a Ferreira Gullar por isso. Gosto do poeta, apenas. Mas há algo que, após todo esse período de campanha eleitoral e de e-mails descabidos lotando minha tela, preciso dizer, num misto de desabafo, constatação, interrogação: Por que, há quase 50 anos do golpe militar e há mais de 20 da queda do muro de Berlim, tantos brasileiros ainda revelam um medo descomunal do comunismo?

Cá entre nós, até ouso uma hipótese: há uma menção de Salwa Al-Neimi, n’A prova do mel, exatamente à página 70, a um episódio televisionado ocorrido à época da Guerra Fria, em que uma senhora soviética responde a um norte-americano “Não há sexo na União Soviética...”. Uma Dilma assexuada e com um passado “comunista” deve soar, para muitos, como uma ameaça... A estes posso sugerir que ouçam uma marchinha de carnaval.

Ah! Sobre o romance lido, pretendo ainda escrever uma resenha. Por ora, deixo-lhes um fragmento do capítulo derradeiro: “Eu sou a dona da história (...). Eu conto e brinco com ela como eu quiser.”