Apertou a toalha ainda mais ao corpo. Não estava frio. Mesmo assim os arrepios não passavam. Os chinelos recostados na entrada do banheiro. Notícias de morte vinham pela TV. Para que o aparelho ligado já tão cedo? A porta entreaberta deixava refletir no espelho a foto que ficara sobre o criado mudo, um tanto difusa pela luz do dia. A lembrança do sonho persistindo...
O odor úmido de sabonete fazia dissipar do ambiente a ausência de cheiro de amor. Já nem sabia mais por quanto tempo estava sozinha. Mas, caprichosamente, tirava a poeira dos móveis do quarto diariamente. Com a mesma frequência trocava a roupa de cama. Gostava de lençóis com estampas de flores. Era o perfume de suas noites. Ah, como ela se fazia pelo olfato!
Qualquer cor de roupa preta lhe serviria, entretanto o ânimo para se vestir estava perdido entre os girassóis na gaveta. A mesma gaveta em que outrora ela havia aninhado delicadezas, babados e abstrações. Preciosidades de uma época em que se vestia romântica como seus devaneios.
Levantou a mão para ajeitar uma mecha de cabelo. A toalha caiu ao chão. Em gesto rápido e decidido pegou-a e atirou ao banheiro. O olhar bateu em cheio no espelho. A foto... Fosse talvez o momento de jogar longe outros objetos também. Despir-se das lembranças...
Antes, porém, convinha desligar a televisão. Convinha guardar o livro que lera pela madrugada. Praticidade e organização sempre lhe foram palavras caras. Pela primeira vez prestou atenção nos sons que vinham da rua. Convinha vestir-se. Dirigiu-se à cômoda. Hora de reencontrar-se por entre os girassóis.
Que lindo...
ResponderExcluirGostei do novo design do seu blog...bem melhor. As flores também eram a sua cara, mas este ficou mais limpo, mas calmo, dá para prestar mais atenção em suas palavras. Beijos.
ResponderExcluirEstes teus instantes, cada vez mais pérolas. Translúcido como um cristal porém capaz de fazer brotar um arco íris. Este particularmente, delimitado num espaço estreito, nos conduz além e para mais além desde que acompanhemos a trajetória dos seus reflexos.
ResponderExcluirMárcia...boa noite !!
ResponderExcluirEu quis ser o primeiro a comentar e não consegui. Sempre tenho problemas em comentar no teu blog. às vezes tento 3 ou 4 vezes e não consigo...
Mas essa crônica é de um lirismo ímpar. Como você consegue abordar sua primeira rotina diária de uma forma tão doce e terna...!!!
Desvencilhar-se de suas memórias e seus afetos passados, despir-se daquilo que fêz parte de tua essência....
Tuas palavras têm um ritmo incomum... trocar a roupa de cama para perfumá-la, pois o cheiro do amor foi-se...
A rua te espera com seus ruídos, barulhos, movimento e energia....troque tua roupa e reencontre-se nos girassóis de tua gaveta...
Não sei se Cecília Meirelles ou Clarice teriam tanta ternura para descrever o instante em que começas uma nova vida, um novo dia!
Beijo!
Marco Aurélio
Eu queria te pedir para dar uma passadinha no meu post:
ResponderExcluirhttp://www.integraldemim.blogspot.com/2009/05/o-quarto-de-despejo.html
nas minhas gavetas bagunçadas tem de tudo, mas não girassóis. nem mesmo um despido de pétalas como este da ilustração. perdida em alguma gaveta tenho talvez uma ex-sogra e olhe lá!
ResponderExcluirabraço
ADOREI!!!!!Se puder e tiver um tempo,
ResponderExcluirpasse lá no meu blog.
Se gostar, me siga ou me "persiga".
Felicidades.
Abraços,
João
www.ludugero.blogspot.com
MÁRCIA,
ResponderExcluirObrigado pelos coments.
Adorei! Você é mesmo DEZ!
Só faltava você lá no meu blog
para FOSFORESCER ainda mais
com sua LUZ.
Volte sempre.
Eu, que não sou bobo, mas espaçoso,
Vou voltar aqui com toda certeza.
Pois gostei do que escreves.
Gosto de sites inteligentes,de bom gosto.
Preciso "fuçar" seu blog com mais tempo,
Quero me deleitar quiçá com suas pérolas.
Forte abraço bastante iluminado.
Seu Amigo João Ludugero.
Até mais!
Indescritível sensação de bem estar, à alma. Belíssima crônica!
ResponderExcluirAgradeço aos amigos de várias postagens, Bruna, Paulo Laurindo, Wilden e Ricardo, pelos comentários. Vocês, como blogueiros, sabem o quanto os comentários nos são importantes.
ResponderExcluir(Em tempo: Wilden, que bom que a ex-sogra está "perdida"!)
Oi, Marco Aurélio
ResponderExcluirCecília Meireles e Clarice? Assim fico extremamente envaidecida!
Viu que passei em seu blog? Adorei!
Beijos
Olá, João Ludugero
ResponderExcluirSeja sempre bem-vindo a este meu espaço! Sinta-se à vontade para "fuçar" as gavetas daqui. Espero que encontre os girassóis que procura e outros mais que possam surpreendê-lo! Beijos.
Oi Márcia!
ResponderExcluirVc tem um bleo espaço. E não apenas pelo design, mas especialmente pelos escritos que encontrei nele. É prazeroso te ler.
Um Beijo!
Que lindo! O dia a dia é de dificil tradução, você sabe que é coisa machadiana. Você tem conseguido isso cotidianamente , hehehe! Sutilmente enredas o leitor na trama dos detalhes íntimos, dos personagens que somos todos e ao mesmo tempo ninguém, eles se perdem na complexidade do humano. Você é complexidade!
ResponderExcluirHumana, demasiada humana! Hehehehe, simplesmente divino.
Beijo
oi marcia pode usar sim aquela imagem beijos,Mi
ResponderExcluirOi, Loba.
ResponderExcluirObrigada pelo elogio!
Seja bem-vinda!
Um beijo
Oi, Anônimo conhecido!
Almas sensíveis em uma escola de engenheiros?!?
Nossa complexidade é o que nos une!
Beijos, meu amigo!
Obrigada, Mi!
ResponderExcluirSaudades dos seus escritos!
Confira depois a nova postagem.
Beijinhos